ASPECTOS
GEOAMBIENTAIS DO MORRO DO ANHANGAVA
O Morro do Anhangava, situado nos limites do Parque Estadual da
Serra da Baitaca, localizado entre os municípios de Quatro Barras e Piraquara,
Região Metropolitana de Curitiba, pode ser considerado um verdadeiro
laboratório à céu aberto para a realização de aulas de campo no âmbito das
Geociências. Todos os anos, as turmas do curso de Gestão Ambiental da Faculdade
Educacional Araucária e as turmas do primeiro ano do Ensino Médio do Colégio
Energia Ativa, realizam a visita técnica ao morro sob minha orientação, onde
procuramos aplicar a observação e a análise dos diversos aspectos físicos,
bióticos e antrópicos que se apresentam no local. Nos anos de 2012 e 2013,
contamos com a participação de meu grande amigo Anderson, professor de Educação
Física do colégio e ex-militar do Exército Brasileiro, que compartilhou os seus
conhecimentos sobre saúde, qualidade de vida e segurança em trilhas. Lembrando que por uma questão de segurança, os alunos alcançam o topo através da trilha frontal e descem pela Trilha da Asa Delta.
Localização do Parque Estadual da Serra da Baitaca
Prof. Anderson (Educação Física, esquerda) e Prof. Fernando (Geografia, direita)
As informações que caracterizam o Morro do Anhangava foram
extraídas do Trabalho de Conclusão de Curso de Tiago Nunes, grande amigo que
tive durante o curso de Geografia na Universidade Tuiuti do Paraná, entre os
anos de 2002 a
2005). Uma curiosidade: a palavra anhangava significa "morada do
diabo".
De acordo com Silva (1985), citado por Nunes (2005), a Serra da
Baitaca está situada na borda leste do Primeiro Planalto, a sua gênese é a
mesma da Serra do Mar, ou seja, está associada à separação dos continentes
Africano e Sulamericano, cujo início ocorreu há mais de 200 milhões de anos.
Decorrente desta dinâmica geológica, o relevo até a cota 1.000 m. s.n.m., é ondulado, e acima desta
torna-se montanhoso e escarpado.
O Morro do Anhangava, ponto culminante da Serra da Baitaca,
alcança 1.420 m. s.n.m., é geologicamente definido por
BIGARELLA et al. (1985),
como um “stock” granítico, capeado e
rodeado pelas rochas migmatíticas e gnáissicas do Primeiro Planalto do Paraná.
De acordo com a classificação de Köeppen, o clima predominante
na área de estudo é o Cfa, onde C significa clima quente e úmido; o mês
mais frio de temperatura média compreendida entre –3º C e 18º C; f indica
clima sempre úmido, sem estação seca, onde o mínimo da precipitação é superior
a 60 mm por mês; e o a indica a temperatura do mês mais
quente superior a 22º C. No entanto, para RODERJAN (1994), as altitudes
situadas acima de 800/1.000 metros na Serra do Mar, podem ser enquadradas no
clima Cfb, que possuem médias térmicas inferiores e ocorrência de geadas
no inverno, sendo b relativo à temperatura média do mês
mais quente inferior a 22º C.
A presença de grandes escarpas, a proximidade do oceano e a
influência dos sistemas atmosféricos, Tropical Atlântico e Polar, determinam a
ocorrência de chuvas orográficas, proporcionando desta forma, grande
nebulosidade, elevados índices pluviométricos e de umidade relativa do ar, que
condicionam o estabelecimento de uma vegetação característica (RODERJAN e
STRUMINSKI, 1992).
Nesta região, situam-se as nascentes dos rios Capivari Mirim,
Ipiranga, Capitanduva e Iraí, contribuindo a oeste e ao sul para a formação da
bacia do rio Iguaçu, a leste para a do litoral e ao norte para a do rio
Capivari, integrantes dos sistemas de captação de água para a Região
Metropolitana de Curitiba e do Litoral.
Muitos consideram a Serra do Mar como
uma "grande muralha", entretanto, é plausível analisar que este
conjunto montanhoso não é único, e sim formado por diversos conjuntos
montanhosos menores separados por vales distanciados de forma significativa,
com destaque para a Serra da Baitaca, Serra da Graciosa, Serra do Ibitiraquire,
entre outros. Por estes vales ocorre a incursão de umidade a partir do Oceano
Atlântico.
A Serra do Mar observada a partir de Curitiba apresenta uma
elevação em torno de 600 m.s.n.m.,
no entanto, a partir do Litoral, observa-se um desnível de aproximadamente 1.000 m.s.n.m., logo
constitui-se uma escarpa.
Delimitação da Serra do Mar no Estado do Paraná
Incursão de umidade entre os vales situados entre os conjuntos montanhosos
Serra do Mar observada a partir de Curitiba (Primeiro Planalto Paranaense)
Serra do Mar (Pico do Marumbi) a partir de Morretes (Litoral)
O Morro do Anhangava situa-se numa área de transição ecológica
entre a Floresta Ombrófila Mista (situada na região do Primeiro Planalto,
também conhecida como Floresta com Araucária) e a Floresta Ombrófila Densa
(situada no Litoral, também conhecida como Mata Atlântica).
Segundo o IBGE (1992), a área do Morro do Anhangava apresenta
zonas distintas de vegetação, definidas pela ação combinada dos fatores
ambientais. A Floresta Ombrófila Mista Montana e a Floresta Ombrófila Densa,
subdividida conforme a altitude e a latitude, em Floresta Ombrófila Densa Montana entre 1.000 e 1.200 m.s.n.m., Floresta Ombrófila
Densa Altomontana entre 1.200 e 1.420
m.s.n.m. e ainda Refúgios Vegetacionais Altomontanos, representados pela
vegetação rupestre, nas altitudes entre 1.250 e 1.420 m.s.n.m, como observa-se na
figura abaixo.
Estratos Vegetacionais do Morro do Anhangava (NUNES, 2005)
Considerando os aspectos fisiográficos detalhados anteriormente,
destaca-se o potencial do Morro do Anhangava para a realização de aulas de
campo envolvendo os conhecimentos geográficos, tais como:
a) geologia, clima e geomorfologia da Serra do Mar, com destaque
para a sua fragilidade potencial, vulnerável aos movimentos de massa em
episódios críticos de precipitação pluviométrica como ocorreu em 2011, suas
vertentes (retilíneas, convexas e côncavas), sua gênese geológica e sua
dinâmica geomorfológica atual;
Apresentado as primeiras informações sobre a gênese da Serra do Mar
Parque Estadual Pico do Marumbi visto a partir do topo do Morro do Anhangava
Pico do Marumbi (foto acima e abaixo), notem ao fundo a Serra da Prata mais próximo do Litoral, arrasada em 2011 por intensos movimentos de massa
Serra dos Órgãos vista a partir do topo do Morro do Anhangava, notem o Pico Paraná no centro da fotografia
Morro Pão de Loth, visto a partir do topo do Morro do Anhangava
b) aspectos vegetacionais: Floresta Ombrófila Mista, Floresta Ombrófila Densa, Ecótono, vegetação rupestre e estratos vegetacionais;
Brinco-de-princesa (Fuchsia hybrida)
Zona do Ecótono (Floresta Ombrófila Mista com Floresta Ombrófila Densa)
Vegetação rupestre
Caraguatá (Bromelia pinguim)
Aspectos da vegetação próximo ao cume
Aspectos da vegetação descendo a Trilha da Asa Delta
Bromélia
Ipê anão (fotografia acima e abaixo)
c) recursos hídricos e abastecimento da Região Metropolitana de
Curitiba, com destaque para a proximidade da Represa do Irai e da presença de
diversos rios tributários deste sistema hídrico que ajuda no abastecimento
público;
Represa do Iraí
Represa do Iraí, notem a cidade de Curitiba ao fundo
d) atividades antrópicas como as extrações de granito que ainda
estão ativas na área do parque e a visitação frequente de públicos diversos ao
morro que auxilia no processo de erosão e alargamento das trilhas. Destaca-se
também a visitação frequente de escaladores em rocha, sendo considerado o Morro
do Anhangava como “morro escola” para escaladas;
Áreas de extração de granito (acima e abaixo)
Escaladores em rocha
e) procurando mitigar o
processo de degradação das trilhas, destaca-se algumas ações de recuperação de
trilhas, principalmente na trilha da Asa Delta, onde existem diversos trechos
onde escalonou-se a trilha na perspectiva de reduzir o efeito runnoff e a energia cinética da água.
Recuperação de parte da Trilha da Asa Delta
f) por fim, destaca-se a presença de uma fauna exuberante na região, embora não seja tão fácil observá-la devido ao grande movimento de visitantes.
REFERÊNCIAS
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